A seca não é o futuro, é agora
Anos a ignorar as alterações climáticas colocaram a humanidade num ponto que ameaça tornar-se irreversível. Ainda assim, há muito que pode ser feito, nomeadamente para assegurar a produção agrícola sem a qual não há alimento.
Há décadas que os avisos de cientistas sobre a crise climática vêm sendo difundidos, talvez não com o apoio mediático de que necessitariam. Agora, o futuro em que estaríamos ameaçados por secas profundas, escassez de água, fenómenos climáticos extremos e aumentos da temperatura que são, em alguns pontos do mundo, incompatíveis com a vida humana, já aqui está: é o nosso presente. No Público, a secção Azul tem vindo a publicar uma série de artigos que analisam com detalhe algumas concretizações da crise climática que globalmente enfrentamos. Um deles, em parceria com a Bloomberg, dá conta da seca extrema no sul da Península Ibérica:
«Se a seca se prolongar por muito mais tempo, Luis López, um olivicultor de 43 anos, receia que as explorações industriais vizinhas, que utilizam o moderno sistema de irrigação para cultivar culturas com grande consumo de água, como a alface e a melancia, comecem a explorar as reservas preservadas de Letur. A seca prolongada na Europa já chegou, décadas antes do previsto “Sinto-me como se fôssemos a última aldeia gaulesa da banda desenhada Astérix”, diz López, referindo-se à saga de ficção sobre a aldeia que resiste à ocupação dos romanos. “Preocupa-me que, quando eles ficarem sem água, venham buscar a nossa.”» Com o continente europeu a aquecer a um ritmo superior ao do resto do mundo, os efeitos na agricultura já se fazem sentir há algum tempo. Este ano, o governo espanhol iniciou o debate sobre as medidas a tomar a breve prazo, numa tentativa de inverter uma situação que se mostra difícil: «Os anos seguidos de seca podem ser devastadores, pois sectores como a agricultura não têm tempo para recuperar, pelo que os impactos se acumulam estação após estação, crescendo exponencialmente. A produção espanhola de azeite — que representa 45% da oferta mundial — deverá reduzir-se para mais da metade nesta estação, enquanto a de cereais como o trigo e a cevada cairá até 60%, segundo Gabriel Trenzado, director das Cooperativas Agro-alimentares de Espanha, um grupo da indústria agrícola.»
Aquilo que fizermos agora, mesmo agindo com atraso relativamente ao que a Ciência vem explicando sem que isso tenha grande eco nas políticas seguidas pelos governos do mundo, será fundamental para assegurar uma produção agrícola capaz de alimentar as populações.