Mudar
Ana Ventura
Pato Lógico
A palavra que intitula o álbum dá-lhe o mote. Mudar não tem conotação negativa nem positiva. Acarreta risco, novidade, adaptação, sucesso e/ou frustração mas por si só não é bom nem mau.
Esta narrativa exclusivamente visual, como todas as que integram a coleção “Imagens que contam”, acompanha um homem desde que parte do seu lugar para outro.
Aí chegado, somam-se pequenos e grandes acontecimentos: a entrada numa nova casa vazia, outro homem com quem estabelece relação numa repartição pública onde trata de documentação, o café ao lado de casa que passa a ser o seu lugar depois do trabalho, o contacto que o outro homem lhe dá da obra onde trabalha, a compra da bicicleta, um novo amor. É uma história de esperança, uma mudança feliz.
Ana Ventura consegue criar ambientes harmoniosos e expectativas sobre a evolução dos acontecimentos através dos detalhes que vai incluindo em cada página.
O diálogo entre o amarelo que representa a identidade do protagonista e o azul que identifica o novo lugar e os seus habitantes autóctones vai-se estreitando, sem nunca ocorrer o apagamento do amarelo. O que acontece é um processo de contágio mútuo que se inscreve na roupa do homem e na de cada pessoa que tem um papel na descoberta do lugar.
Assim, o seu traje amarelo liso vai ganhando flores e ramagens de outras cores, sendo a primeira rosa, depois castanha, azul, branca, laranja… até percebermos, no perfil que se retrata na contracapa, a dimensão desta vida que ganha raízes.
A imagem bucólica da natureza traz poesia ao álbum, pela delicadeza do movimento, pela subtileza dos apontamentos nas roupas, pela presença dos ramos das árvores que ora se veem na rua, ora se alcançam pela janela de casa. Também a loja de plantas, os vasos nas janelas, as flores que várias pessoas transportam a pé ou de bicicleta e a planta que já o espera quando chega pela primeira vez à sua casa ainda vazia, compõem um espaço natural de fruição e cuidado.
A passagem do tempo tem igualmente um efeito de crescente felicidade: as estações do ano sucedem-se, percebemo-la pelo calendário na parede, pelo estado do tempo, pelas roupas e pelo crescimento das plantas.
Se o álbum se intitulasse raízes também não estaria mal porque é justamente disso que se trata, de ganhar raízes e florescer. O final surge com o aparecimento de uma nova personagem e uma nova cor, simbólica também. Esta mudança é sobre a felicidade, a gratidão, o gostar e o cuidar. E sobre como a tarefa se torna poética quando cada um se dedica genuinamente a conhecer o outro, sendo que outro pode ser sempre qualquer um.