A bola vermelha
Vanina Starkoff
Orfeu Negro
A primeira surpresa do álbum é a cor. Entre gravuras, lápis e tintas, apenas o preto, o branco e o vermelho constam desta composição cromática. Ao contrário do que acontece nos dois álbuns anteriormente editados em Portugal, a ilustradora argentina opta por outra abordagem estética, muito menos festiva. Porém, a sobriedade do preto e branco em nada macula o sentido poético que caracteriza a sua exploração temática.
Alguém colhe fruta de uma árvore. Tudo existe em harmonia: a mulher, as árvores, o horizonte. O contraste não se encontra aqui. O branco e o negro são complementares na existência de cada elemento. O inesperado acontece quando, no momento seguinte, a protagonista repara numa bola vermelha que jaz no solo. É então o vermelho que rompe, que se destaca, que dá relevância primeira àquele pretenso objecto.
Logo começa uma busca pelo seu lugar. A rapariga não se apropria da bola, não tem nenhuma intenção de a tomar para si. E em nenhum momento a questão se coloca ou a opção se justifica. Cabe ao leitor segui-la ou estranhá-la.
Activamente, a protagonista procura identificar a bola com outras figuras que em tudo se lhe assemelham. Mas um olhar mais próximo amplia as diferenças: a bola não é uma fruta, nem uma aranha, ou uma porca, ou uma joaninha, nem um novelo ou uma concha. A bola vermelha não tem pares. Porque será que a mulher/menina o considera tão necessário? Ficará ao critério de quem lê.
Chegadas ao clímax narrativo, tudo se desenrola pelo melhor. As palavras são parcas, reduzem-se a onomatopeias que acompanham o espanto, a frustração e o sucesso.
Há em todo o livro um cuidado com o essencial que o despoja de desvios. Aí reside também a sua poeticidade, na atenção àquela bola e àquela missão. Sem mais enleios a mensagem ganha força pela urgência de se fazer existir, de se procurar identificar e reconhecer. Ou, se preferirmos, é apenas um jogo de inocência, palavra importante na epígrafe do álbum.
Todavia, é certo que a leitura interroga. E neste caso, ficar sem resposta é, por si só, uma bela resposta.