Em dezembro de 2007, o arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer completou cem anos de vida. Para celebrar a data, seus familiares pediram aos amigos do artista que enviassem as suas mensagens de parabéns. As cartas, vindas dos quatro cantos do mundo, foram reunidos num livro que foi entregue a Niemeyer no dia do seu centésimo aniversário.
A revista Blimunda recupera nesta edição a mensagem que José Saramago enviou ao seu amigo e camarada de partido, que faleceu em dezembro de 2012, aos 104 anos.
Creio que não se tem reparado numa das maiores diferenças existentes entre o português e outras línguas neo-latinas. Um espanhol, um italiano ou um francês, no dia do seu aniversário, dirão, com uma expressão algo insegura: “Hoje cumpro x anos”. Como se não tivessem bem a certeza de os haver cumprido de acordo com as regras e as disciplinas estabelecidas pelos diversos mentores sociais.
Nós, portugueses, nós, brasileiros (acabo de comprová-lo no Aurélio) não cumprimos anos, fazemo-los. Já se pensou no bonito que é mexer no tempo, empurrá-lo, estendê-lo, empurrá-lo, e a isto chamo eu vida, e de repente começar a receber e-mails, cartas, chamadas telefónicas de parentes e amigos que nos dizem: “Parabéns, mais um ano”. E nós respondemos: “Bom trabalho me deu, mas aí está, feito”.
Aí estão agora estes cem, feitos por Oscar Niemeyer, amassados de todas as esperanças e razões do mundo, entregues nas mãos do futuro, com estas palavras de promessa: “Aqui estive, aqui estou, aqui me encontrarão sempre”.
Querido Oscar, até ao próximo ano.
José Saramago, dezembro de 2007