Espelho Meu Andreia Brites 28 Junho 2022

Que planeta é este?
Eduarda Lima
Orfeu Negro

O segundo álbum da ilustradora portuguesa Eduarda Lima segue as pisadas de “Protesto”, editado em 2020. O ativismo ambiental regressa, desta feita não através do protesto silencioso mas da ação.

Dá-se um apagão na cidade. Nada funciona, incluindo gadgets, eletrodomésticos, luz elétrica. A narradora, a filha mais nova numa família com a mãe, a irmã mais velha e o pai, recorda-se de um presente da avó, que vinha com uma sugestão: “para quando um dia ficarem sem internet”. Trata-se de uma enciclopédia que apresenta lugares naturais de incrível beleza.

Ainda estamos no início da história e nada é ao acaso. Não é ao acaso que é a criança quem reage e procura uma alternativa para a escuridão, não é ao acaso que o presente foi oferecido pela avó e também não é irrelevante que o próprio presente e a consequente solução esteja num livro. Nos três elementos encontramos um manifesto: a criança que ainda tem curiosidade e faz parte do grupo etário que mais consciência ambiental tem, logo aquela em quem depositamos esperança para mudar o presente e o futuro; a avó que viveu grande parte da sua vida sem esta dimensão tecnológica, virtual e sempre mediada, e o livro, o objeto perfeito que sobrevive ao tempo e abre as portas para outras vidas, outros lugares, imaginação e conhecimento.

É o que acontece com a protagonista que começa a viajar por lugares desconhecidos ao percorrer aleatoriamente, de acordo com a sua vontade, este Guia ilustrado das maravilhas da natureza. E subitamente, após visitar o Glaciar Mendenhalll e o Desfiladeiro do Antílope, eis que a menina já não está sozinha nesta exploração: um a um, todos os membros da família se juntam e partilham o deslumbramento da natureza nas suas diversas manifestações.

Dá-se então um clique. Uma ideia nova surtirá um efeito transformador que, no final, se percebe ter sido coletivo e revolucionário. Nas páginas finais acontece a utopia, possível mas difícil. Porém, fica como hipótese, como desejo, como esperança. Como contributo ativista.

A narrativa textual e visual leva o leitor a transportar-se para cada cenário, cada ambiente, como se estivesse a viajar com a família. A paleta de cores, com predominância dos vermelhos, verdes e azuis, ora vivos ora suavizados por matizes mais claros, o jogo de contrastes e de luz e sombra, as perspetivas e as dimensões, as formas e o movimento, todos estes elementos se conjugam em representações expressivas de algo sublime. 

A apologia funciona, e ainda pode fazer ecoar um outro álbum delicioso, O Jardim Curioso, de Peter Brown. 

→ orfeunegro.org