Na despedida de Nélida Piñon
Em português, dos dois lados do Atlântico, mas também em galego, castelhano e outras línguas, a imprensa despediu-se de Nélida Piñon.
Nélida Piñon morreu no passado dia 17, em Lisboa, aos 85 anos. A sua partida foi lembrada em muitas línguas, não fosse a autora o produto familiar de uma travessia que começou na Galiza e acabou no Brasil. Estreou-se no romance com Guia-Mapa de Gabriel Arcanjo, em 1961, e o seu último livro foi igualmente um romance, Um Dia Chegarei a Sagres, publicado em 2020. Pelo meio, houve muitos livros de contos, memórias, crónicas e ensaio, tomos fundamentais para uma visão justa da literatura brasileira das últimas décadas, mas também das relações entre as várias variantes do português, e também o galego, língua comum.
Foi a primeira mulher a presidir à Academia Brasileira das Letras, mas foi sobretudo uma escritora extraordinária, focando parte da sua obra nas diásporas e na imagem das pessoas migrantes, independentemente do motivo que as fez partir de uma terra e chegar a outra. No El País, um obituário assinado por Joan Royo Gual traça o percurso desta autora brasileira com raízes galegas, que manteve sempre essa ligação forte entre ambos os lados do Atlântico. O texto relembra, aliás, o discurso que fez em 2014, quando a Academia Galega lhe outorgou um dos seus assentos: «Explicó que su familia le permitió formarse libremente y dedicarse desde muy joven a la su gran vocación, la literatura. De hecho, los padres renunciaron a volver a Galicia. “No perdía de vista que los abuelos y mi padre, al atravesar el Atlántico para nacer yo en Brasil, habían sido objeto de una decisión política cuyo contenido ignoraban, que expulsaba de España ese contingente excedente, para aliviar la miseria reinante… A causa de esa decisión, la familia me regaló la majestad de la lengua portuguesa, la ciencia de pertenecer al nuevo continente. Y me transmitió igualmente la noción de constituir un privilegio ser originaria de una Galicia cuya herencia me autorizaban a reivindicar”.»