Um Feminismo Decolonial
Françoise Vergès
Orfeu Negro
Tradução de Anabela Carvalho Caldeira e José Alfaro
O funcionamento das cidades em que boa parte da humanidade vive e trabalha é assegurado, diariamente, por um batalhão de pessoas que são, na sua esmagadora maioria, mulheres não-brancas. Essas mulheres, que apanham os primeiros transportes da madrugada para chegarem aos escritórios e empresas a tempo de limparem tudo sem que a tarefa se encontre com o horário dos restantes trabalhadores, e que depois disso ainda vão limpar outros espaços, muitas vezes casas privadas, ou tomar conta dos filhos de outras pessoas, são mulheres que não vemos, porque a sociedade encontrou forma de as manter invisíveis: «Tal trabalho, indispensável ao funcionamento de qualquer sociedade, tem de permanecer invisível. Não devemos ter consciência de que o mundo em que vivemos é limpo por mulheres racializadas e sobre-exploradas.» É a partir dessa constatação que Françoise Vergès inicia a sua análise sobre o papel atribuído a estas mulheres pela sociedade capitalista, à medida que cruza essa análise com a de outros contextos histórico-sociais, nomeadamente o do colonialismo, para propor uma prática feminista que responda às muitas desigualdades que contribuem para manter as mulheres, em particular as racializadas, num papel de subalternidade.