O Sr. Gato Mágico
Henrique Coser Moreira
Planeta Tangerina
Há muitas maneiras de contar uma história. Podemos começar pelo início e seguir os acontecimentos até ao fim, podemos começar pelo fim e chegar ao princípio, podemos contar a história a várias vozes ou só através de uma perspetiva, podemos contar várias histórias que se relacionam. As possibilidades são inúmeras, dependem da história – do que há para contar – e da forma como a queremos contar. Há histórias lineares, há histórias misteriosas, há histórias contemplativas, há histórias absurdas, há histórias caricaturais. Todas elas existem tanto na literatura para adultos como na literatura infantojuvenil. Todas elas cabem em contos, novelas, teatro, banda-desenhada.
Esta história é integralmente narrada através de imagens que se sucedem em vinhetas sequenciais. É através da lente do ilustrador que nos apercebemos dos estados de espírito do gato, das suas motivações, daquilo que o surpreende. Também é através dos planos gerais que não só conhecemos o ambiente espacial onde vive o protagonista – o gato mágico – como igualmente é gerido o ritmo da ação – a mudança de cenário, sobretudo.
A narrativa é simples e acontece de modo linear, e essa simplicidade resulta de um domínio seguro das técnicas da narrativa visual.
Tudo começa quando o gato mágico, que está a ler, fecha o livro, tosse e decide fazer chá. São doze planos próximos, dos quais se destacam aqueles em que a chaleira varia as expressões, em cada fase do processo. Sim, a chaleira tem olhos e boca. Depois, o grande plano do relógio trará algo importante para a ação, ou não seria um grande plano. Mas, por enquanto, são apenas 8.20 e os ponteiros parecem um bigode no rosto simpático do relógio.
O gato volta à leitura para rapidamente a abandonar e se dirigir à janela. É a primeira vez que a divisão se mostra ao leitor. Minimalista. O branco prevalece dentro e fora de portas. E numa só vinheta de página dupla o gato desloca-se da janela para a porta. São vários momentos e movimentos que traduzem a deslocação do protagonista.
Acontecem então os principais acontecimentos que vão legitimar o título do livro e a característica atribuída ao gato. No espaço vazio é operada uma profunda intervenção, que o transformará por completo. Essa intervenção sai diretamente das mãos deste Sr. Gato mágico.
Podemos afirmar que é uma narrativa sobre a importância da natureza e da vida, por oposição ao vazio, podemos defender a urgência da diversidade, podemos simplesmente assumir que é entediante é triste estar sozinho.
Podemos ainda questionar o livro sobre os poderes mágicos de gato (se já os tinha ou não) e sobre todos os objetos que também têm vida. O livro não dá qualquer justificação ao leitor, tudo se resume a narrar aquele acontecimento fantástico. Mas nele há a subtileza dos detalhes e o contexto que cada imagem nos dá. Que o livro nos dá a ler.