Lisboa, capital do desalojamento
Uma visita pelas ruas de Lisboa, acompanhando a Sirigaita e lembrando as tantas associações despejadas nos últimos anos.
Uns dias antes do Natal, a Sirigaita, associação lisboeta que está entre as várias com desalojamento marcado para o início de 2024, organizou um passeio pela Lisboa das colectividades e das associações, essa cidade onde partilhas e solidariedades várias foram criando grupos e acções que agora se vêem sem espaços para reunir e trabalhar. Os despejos já começaram há algum tempo e prometem continuar ao ritmo de uma especulação imobiliária que vai alimentando a fúria da conversão da cidade ao turismo e só ao turismo. São associações que pagam (pagavam) a renda atempadamente e que, de um momento para o outro, viram essa renda subir até valores impossíveis, exactamente como tem acontecido com centenas de inquilinos que deixaram de poder pagar uma casa.
No site Buala, Carla Baptista acompanhou a visita, uma espécie de excursão pelos lugares que até há pouco tempo tinham vida e criavam laços de vizinhança e são, agora, prédios prometidos a mais uma cadeia hoteleira ou a mais um condomínio de luxo. Do Clube Recreativo dos Anjos ao Grémio Lisbonense, passando pela associação Banco ou pelo Grupo Excursionista e Recreativo Os Amigos do Minho, a visita lembrou esses lugares e reuniu ideias e vontade de resistir por parte de quem nela participou: «O tom da iniciativa, porém, não deve ser descrito como nostálgico. Há muita gente que ainda não baixou os braços e continua a habitar e a lutar pela sobrevivência e pela partilha das coletividades, dos espaços de experimentação artística, de debate político fora da esfera partidária, de festa e entreajuda. Em cada paragem, houve canções cantadas pelo Coro da Achada, a maioria versos de luta ou de simples maravilhamento pela vida que acontece. A primeira canção celebrou a existência nos versos de Mário Dionísio – Em cada ano/A seiva é nova/Em cada ano/A planta cresce/A folha nasce/A flor rebenta – e uma das últimas, com letra e música do maestro da Achada, Pedro Rodrigues, apelou à coisa que interessa, estarmos juntos: Se temos fome de liberdade/Sem justiça não há paz/Sozinho sabes que não vais ser capaz/Entusiasmo, recomeçar/Outra batalha.»