Mesmo que eu volte cem vezes a Florença, mesmo que escolha o dia e a luz, não tornarei a sentir o arrepio físico (sim, o arrepio físico, no sentido literal, fisiológico, da expressão) que me percorreu da cabeça aos pés diante da entrada da Biblioteca Lourenciana que Miguel Ângelo projectou e construiu. Seria um milagre, e os milagres, se os há, são preciosos de mais para se repetirem (…) O trabalho da memória é conservar estas prodigiosas coisas, defendê-las do desgaste banalíssimo do quotidiano, ciosamente, porque talvez não tenhamos outra melhor riqueza.
A Bagagem do Viajante, 1973